Ana Deus é uma mulher da música e das palavras.
Nasceu em Santarém, em 1963. Recorda-se de uma infância feliz e bem frequentada: havia fábricas de gelados, bolos-reis e amêndoas da Páscoa na vizinhança; também castanhas e farturas por perto, e ainda um armazém de marmelada no rés-do-chão do prédio.
No meio de tudo isto, Ana Deus brincava ao Festival da Canção, cantando para a vizinhança, nos terraços. Talvez por isso – diz ela, lhe oferecessem tanto.
Uma vizinhança de amor para acolher uma voz que ainda hoje se assume incrível, cristalina, potente. Das memórias, Ana também recorda o amor do pai pela guitarra e as sessões familiares em que cantava, acompanhando com a sua voz, as canções que o pai tocava.
Ser criança é fácil. Crescer trouxe-lhe, no entanto, o confronto com a misoginia e a consciência de um ambiente tóxico reflexo de um país preso no machismo dos anos 60.
Ana saiu de Santarém, depois da morte da mãe. Nunca mais voltou.
Foi para a cidade mais longe que encontrou no mapa: o Porto – cidade que a acolheu e lhe trouxe a família que escolheu. Podemos encarar o ato como uma inspiração divina: um eco musical atraiu-a através da música dos GNR e de Rui Veloso que vinha do Porto nessa altura.
Ana Deus, a mulher que triunfa na música portuguesa – primeiro nos Ban, depois nos Três Tristes Tigres e mais recentemente, também no projeto Osso Vaidoso – diz-se perita em tropeçar no erro e com consciência da sua auto-censura. Sugere o livro “De Nada” de Alberto Pimenta; o disco “The Way Out” (The Books) e o espectáculo “Shakespeare Sonette” de Robert Wilson, Rufus Wainwright & The Berliner Ensemble. Este episodio foi gravado ao vivo, no Maus Hábitos, no Porto, a 24 de Janeiro de 2022.
Ana Deus
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